Até então, os investigadores interpretavam que tanto a polícia quanto o Ministério Público poderiam solicitar informações ao Coaf, desde que houvesse um inquérito instaurado sobre o caso. No entanto, com a decisão do STJ, essa prática fica restringida e poderá afetar centenas de processos em andamento.
Uma das investigações que podem ser impactadas é a relacionada aos supostos financiadores dos atos golpistas de 8 de janeiro. A decisão da Sexta Turma do STJ contraria a posição já manifestada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em um julgamento de 2019, quando o STF considerou válido o compartilhamento direto entre Coaf, polícias e Ministério Público, desde que fossem seguidas as regras específicas. Na ocasião, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) pediu a anulação de provas contra ele no processo que investiga o esquema de rachadinha em seu gabinete.
No caso analisado pelo STJ, o voto vencedor foi o do ministro Antônio Saldanha Palheiro. Ele argumentou que a possibilidade de solicitação direta da Polícia Federal ao Coaf, sem autorização judicial, se encaixa “em uma situação diversa da qual foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal.”
Os advogados responsáveis pelo habeas corpus que originou a decisão no STJ afirmaram que, no caso em questão, a Polícia Federal solicitou as informações ao Coaf apenas 10 dias após a instauração do inquérito e para um período de seis anos e cinco meses. Eles argumentaram que essa medida não se encaixa no previsto pela decisão do STF de 2019.
O ministro Dias Toffoli disse, em sua decisão 4 anos atrás, que “não há dúvidas, quanto a possibilidade de a UIF (Unidade de Inteligência Financeira) compartilhar relatórios de inteligência [RIF der intercâmbio] por solicitação do Ministério Público, da polícia ou de outras autoridades competentes”.
No entanto, o diretor da Transparência Internacional Brasil, Bruno Brandão, concluiu que a decisão do STJ “confunde os relatórios de inteligência financeira do Coaf com quebra de sigilo bancário”, o que, na interpretação dele, pode reduzir a capacidade do país de investigar casos de lavagem de dinheiro e até esquemas que envolvam tráfico de drogas e desmatamento ilegal.
Segundo a Folha de S.Paulo, além disso, há preocupações de que a decisão possa afetar os compromissos internacionais do Brasil em relação à prevenção da lavagem de dinheiro, especialmente perante o Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi), um importante organismo multilateral de coordenação de esforços globais na luta contra a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo.
O Brasil está atualmente passando por uma avaliação pelo Gafi, o que torna essa decisão do STJ ainda mais relevante e controversa. A capacidade das autoridades brasileiras de fazerem pedidos diretamente ao Coaf era considerada um aspecto fundamental para o combate eficaz à lavagem de dinheiro e crimes financeiros no país.