"Desfiou monólogo insidioso sobre o sistema eletrônico e a Justiça Eleitoral. Com habilidade, costurou os retalhos de informações falsas já tão naturalizadas em sua fala que soavam legítimas, usou como linha o simulacro de desejo por eleições transparentes e por resultados autênticos. Bordou discurso com apelo rude para que a comunidade internacional não desse ouvidos ao TSE e arrematou os pontos com alerta de que algo precisava ser feito, uma ação ainda ser verbo, mas que partia da ideia de que a simbiose Presidência da República/Forças Armadas jamais aceitaria uma imaginária farsa eleitoral. O resultado dessa tapeçaria não ornou com fundamentos sobre os quais o brasil se constrói como estado democrático."
No voto, Benedito Gonçalves apresentou uma versão resumida. O ministro defendeu a inclusão, no rol de provas do processo, da minuta de golpe achada na casa do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, que pedia a decretação de intervenção no TSE e anulação do resultado da eleição.
"Destaco eu a admissibilidade da minuta não confronta, revoga ou contraria nossa jurisprudência formadas nas eleições de 2014 a respeito dos limites e objetivos da demanda", disse o relator.
Benedito disse que a minuta do golpe tem conexão com o pedido da ação, apresentada pelo PDT, no qual o partido cita a desinformação sobre o processo eleitoral por Bolsonaro.
O relator citou ainda o caso do julgamento da chapa Dilma-Temer, em 2017. Na ocasião, o TSE rejeitou incluir novas informações sobre supostas irregularidades que teriam beneficiado a chapa no pleito de 2014 por entender que os fatos novos “não foram apresentados como desdobramentos” do relato inicial.
Para Benedito, no julgamento contra Bolsonaro, “basta a leitura da petição inicial para constatar que o PDT imputou aos investigados a estratégia político-eleitoral assentada em desinformação das urnas e da atuação desse tribunal”.
O ministro afirmou também que em razão da grande relevância e da performance discursiva para o processo e eleitoral e para a vida política, "não é possível fechar os olhos para os efeitos antidemocráticos de discursos violentos e de mentiras que colocam em xeque a credibilidade da Justiça Eleitoral".
"Já assinalamos que um fato sabidamente inverídico justifica o direito de resposta de candidato ou candidata, partido ou coligação por ele atingido. Da mesma maneira há de se reconhecer que a divulgação de notícias falsas é, em tese, capaz de vulnerar bens jurídicos eleitorais de caráter difuso desde que sejam efetivamente graves e assim se amoldam ao conceito de abuso", disse.
Ainda no voto, Benedito afirmou que "diversas partes do discurso revelam que Bolsonaro investiu energia em convencer que seu relato merecia mais confiança que as informações do TSE".
Após o voto de Benedito, os demais ministros votarão na próxima quinta-feira (29) na seguinte ordem: Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques, André Ramos Tavares, Cármen Lúcia, Nunes Marques e Alexandre de Moraes.
Para o MPE, há indícios de abuso de poder político, abuso de autoridade, desvio de finalidade e uso indevido dos meios de comunicação por parte do ex-presidente Bolsonaro.
O general Walter Braga Netto, que foi candidato a vice na chapa de Bolsonaro, também é alvo da ação. No entanto, o MPE defende a absolvição de Braga Netto, por entender que não houve a participação dele nos fatos investigados na ação.
QUEM É BENEDITO GONÇALVES
Conhecido pelo sorriso largo e pela simpatia com servidores, o ministro Benedito Gonçalves, do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), se tornou figura central no julgamento de ações que podem deixar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) inelegível por oito anos. Ele deu o primeiro voto na sessão desta segunda 27, e que se posicionou pela condenação do ex-mandatário.
Primeiro ministro negro do STJ Benedito integra o TSE desde 2019, quando entrou como ministro substituto na cadeira reservada aos juízes do STJ. Em 2021, se tornou ministro efetivo e, no ano passado, o corregedor eleitoral da Corte.
Amigo de Lula foi indicado ao cargo pelo atual presidente.
O ministro foi nomeado ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) pelo presidente Lula (PT), em 2008, e se tornou o primeiro negro a integrar o tribunal. Antes, Benedito Gonçalves havia sido juiz e desembargador na Justiça Federal do Rio de Janeiro. No início da carreira, prestou concurso público e se tornou delegado da Polícia Civil do Distrito Federal, posto ocupado entre 1982 e 1988. Por 11 anos, foi papiloscopista da Polícia Federal. Em 2020, o ministro afastou o então governador do Rio, Wilson Witzel, por suspeita de corrupção. A decisão foi referendada pelos colegas do tribunal por 14 votos a 1.