Diferente do modelo usado na gestão Bolsonaro, que era mais informal e até “caseiro”, o tom da conversa com Lula se assemelha ao modelo de podcast, mas com discursos habituais de campanhas. “O povo brasileiro tem que ter paciência”, “estou extremamente satisfeito” e “vamos trabalhar muito” foram algumas das frases emblemáticas do presidente na primeira entrevista, de 13 de junho, quando ainda disse que “nunca teve problemas com o agronegócio”, embora tenha, dias antes, criticado a Agrishow, maior feira do agronegócio do país, e chamado seus organizadores de “facistas” e “negacionistas”. As transmissões seguintes não foram diferentes. Embora Lula tenha chegado a falar sobre suas próximas viagens ao exterior e projetos de leis sancionados, em mais de uma ocasião ele perdeu a oportunidade de adotar o tom de prestação de contas aos espectadores, como citando o resultado das viagens internacionais para o país, por exemplo. As “conversas com Lula” também abordaram, em “tom diplomático”, temas como meio ambiente, críticas à gestão anterior e ao 8 de Janeiro, a aprovação da reforma tributária e a relação com o Congresso Nacional, mas não houve a menção às seguidas liberações recordes de emendas parlamentares, nas vésperas das votações. “Não é a política que é dando que se recebe”, chegou a dizer Lula.
No total, as cinco transmissões ao vivo, se somadas, chegam a pouco mais de 570 mil visualizações. Sendo que a primeira soma 183 mil visualizações e a última, 77 mil – o que, além de tudo, mostra um evidente declínio na audiência. Ainda que as lives tenham sofrido mudanças de cenário para reverter o fracasso inicial, a avaliação é que, por mais que Lula fale bem, o formato aparenta uma propaganda política e não atrai a população. “Isso diverge muito do que o Bolsonaro fazia, porque apesar dos cenários precários, ele apresentava uma imagem mais espontânea na forma e nos conteúdos, nas falas, nas explosões que ele tinha. Lula, ao contrário, está sempre muito simpático, falando que quer ajudar a população. É um processo de aprendizado por parte do Partido dos Trabalhadores, que tem um problema de comunicação histórico com a população”, explica o cientista político Paulo Niccoli Ramirez, da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) a imprensa.
Enquanto o atual formato aparenta uma campanha e se assemelha aos discursos protocolares de Lula, o modelo anterior, com foco na prestação de contas, se justificava como um serviço ao cidadão. “A sensação é que a conversa com Lula foi orquestrada, as perguntas foram previamente estabelecidas. Não há uma interação direta com o público, tal como Bolsonaro expressava em suas lives. E ainda que Lula mostre um certo otimismo, isso sempre soa como campanha eleitoral. Esse formato é mais do mesmo que vemos nos discursos do Lula, nos protocolos presidenciais ou mesmo durante as campanhas”, pondera o cientista político. Paulo Niccoli Ramirez afirma que, mesmo com as críticas ao antecessor, Lula adota um tom político e de permanente otimismo, o que não soa verdadeiro. “Bolsonaro, com todas as suas falhas, parecia mais humano. Não em termos de carisma ou competência, mas de ser mais falho e dialogava com um público dele. Já Lula, não. Ele tenta falar para todos, o que acaba afastando uma parte do eleitorado que não gosta dele e vê como manipulação e hipocrisia essa ideia”, conclui.